O Dossiê 13
A
água estava no meu pescoço.
Não
caro leitor, não é uma linguagem figurada. A água realmente estava no meu
pescoço. E estava subindo cada vez mais.
Eu
não sabia mais o que fazer. A investigação parecia me levar somente a becos sem
saídas, esquinas mal iluminadas, ciclovias esburacadas.
Enquanto
me deitava na banheira do hotel e deixava a água escorrer pelo chão até o ralo,
eu pensava e pensava. Afinal de contas, onde estaria o Dossiê 13?
Como
o leitor pode imaginar, mais uma vez fui encontrado em meu esconderijo turístico
pelo rapaz de roupas coloridas que trabalha no Xavante, a famigerada
instituição jornalístico-investigativa do Instituto de Artes da Unicamp. Dessa
vez, ele me informou de um gigantesco evento artístico do mais alto renome que
ocorreria em sua cidade: O FEIA.
Conforme
ele ia me contando sobre os diversos eventos, oficinas, apresentações do mais
alto calibre no mundo artístico, eu ia percebendo onde estava me metendo. Após
as investigações anteriores que realizei para o Xavante (disponíveis no site do
jornal/revista) e as terríveis descobertas que fiz nelas, sabia que um evento
tão grande só poderia estar relacionado a um incidente de proporções colossais.
Eu
subestimei a situação.
O
rapaz de roupas coloridas me informou que a organização do Festival havia
entrado em contato com o jornal para que descobrissem o paradeiro de um dito
dossiê, o Dossiê 13, que continha informações secretas de importância inigualável,
e que havia sumido poucos dias antes do começo do evento. Peguei o primeiro
avião de volta a Campinas.
Dessa
vez, uma investigação de tamanho porte não poderia ser feita sem ajuda. Contatei
meu antigo assistente e passei instruções para que ele cobrisse algumas
frontes. Por ser jovem, enviei-o para uma festa onde alguns informantes me
disseram que o Dossiê poderia ser repassado. O jovem foi sagaz e contratou um
cinegrafista para gravar suas investigações. O vídeo pode também ser assistido
no site do Xavante, caso a curiosidade do leitor extrapole seu senso de autopreservação.
Em
pleno fervor do Festival, pistas se confirmavam. Descobri por processos de alta
tecnicidade investigativa que o ladrão do Dossiê estava consumindo um toddynho
enquanto realizava o furto. A caixinha encontrada enquanto eu revirava o lixo
da sala de operações da organização do FEIA, assim como a assumida preferência
dos membros dessa organização por nescau não deixava dúvidas.
Observando
os convidados ilustres do Festival, percebi nervosismo nos membros de uma das
bandas convidadas. A mesma que tocaria na festa que não sem motivos enviei meu
assistente. Lá ele descobriu que de fato a banda havia repassado uma pasta
deveras suspeita para um homem careca. Fui rapidamente atrás dos membros da
banda, mas estes eram inocentes. Haviam sido ameaçados.
Outras
pistas foram levantadas na festa: um possível envolvimento do Pentágono, a
presença de uma banana, e, por fim, o envolvimento de um aluno do curso de
artes cênicas da Unicamp (cujo nome será omitido nesse relatório para proteger
a identidade do dito aluno/ possivelmente futuro ator global).
Fui
atrás do dito aluno que parecia muito abalado após a festa. Sofria de enjoos,
dores de cabeça e cansaço. Supus que ele havia sido envenenado. Conversamos por
horas e só o liberei após ter certeza de que era inocente e alongado.
Então
aqui estamos nós, de volta à banheira.
A
água já estava gelada quando finalmente eu entendi.
A
banana! Tudo se ligava na banana!
Levantei-me
nu e pingando água pelo apartamento quase escorregando enquanto me vestia na
pressa de sair. O tempo estava contra mim: eu havia vacilado.
Dirigi
o mais rápido que pude nas ruas congestionadas de Barão Geraldo chegando até a
subir na ciclovia com minha Brasília ano 79. No estacionamento da Unicamp
cheguei a tempo de ver as costas dele. Sua careca que terminava num rabo de
cavalo, entrando num helicóptero. Eu havia chegado tarde demais. O helicóptero
com o símbolo do Pentágono levantava voo e nele o homem da banana, o careca
cabeludo, partia em posse do Dossiê 13.
Foi
quando ouvi meu nome, gritado atrás de mim por sobre o barulho de outro
conjunto de hélices. Meu assistente me mandava subir no helicóptero do Xavante.
Íamos ter uma bela de uma perseguição nos ares.
Dei
a mão para ele e subi no veículo. O rapaz de roupas coloridas pilotava, o que
me fez repensar meu conceito sobre sua idade. Seguimos o outro helicóptero e
gritei no megafone para que ele se entregasse, para que devolvesse o dossiê,
pois eu já havia descoberto tudo. Nossos oponentes viraram bruscamente para nos
atingirem com suas armas, mas nosso nem-tão-jovem-assim piloto esquivou-se com
manobras evasivas. Não podíamos revidar, pois nosso veículo não era um de
guerra como o de nossos opositores, então subimos rumo à escuridão da noite.
Eu
senti meu sangue pulsar forte em minhas veias. Um plano surgia em minha cabeça.
Ordenei que o piloto arremetesse o helicóptero para cima do outro e foi o que
ele fez. O piloto do Pentágono havia achado que tínhamos fugido e levou um
susto com nossa aproximação súbita da escuridão. Achando que íamos nos chocar,
ele virou o veículo de lado, o suficiente para que eu fizesse a maior tolice de
minha vida.
Um
salto.
De
arma em punho eu pulei para dentro do outro helicóptero enquanto o meu próprio
passava arranhando. O susto de meus inimigos me deu tempo suficiente para me
recuperar da batida no chão de seu helicóptero e de arma apontada eu os rendi.
O
Dossiê foi devolvido à organização do FEIA, seu conteúdo nunca revelado. Os
envolvidos no roubo sumiram, claramente acobertados pelo alto escalão do
Pentágono. E eu claramente havia feito um inimigo muito além da minha alçada.
Teria que me esconder novamente.
Enquanto
andava no banco de carona do carro de meu assistente vi pela janela. O homem da
banana sentava em um ponto de ônibus. Vestido de aluno da Unicamp ele comia uma
banana com casca e tudo. Tomem cuidado caros leitores: há mais olhos os
observando do que vocês pensam.
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